por Tacia Rocha

 

            Já parou para pensar que não é redundância destacar o quanto a sua vida é permeada pela mídia? Olhe só: para começar, o seu celular é uma janela para o “mundo”, que possibilita acesso a notícias, a conteúdos de entretenimento, de saúde, de moda, de comportamento etc. por meio de sites, de aglutinadores de vídeos e de mídias sociais; aliás, estas também são vitrine para pessoas mostrarem suas vidas pessoais, bem como o seu trabalho, vendendo produtos ou serviços; você pode comunicar-se rapidamente por meio de aplicativos de mensagens instantâneas; existem, também, aqueles serviços bancários, consultas em geral ou mesmo compras que podem ser agilizados por meio de aplicativos. Além disso, já faz parte do orçamento de muitos/as brasileiros/as a assinatura mensal do conteúdo por demanda disponibilizado em plataforma de instream que dá direito a assistir a séries e a filmes quando, como e onde quiser, desde que tenha conexão. Identificou-se com algumas dessas atividades?

            Como as práticas descritas se “naturalizaram” ao longo das últimas décadas, não ficamos pensando, a todo momento, no quanto esse consumo de conteúdo depende da nossa participação ativa nem que circulamos por diferentes sistemas de mídia em busca de conteúdo. E mais, ao nos identificarmos com esse ou com aquele conteúdo, nós estamos inventando ou, ainda, comprando identidades para nós mesmos. No entanto, muita gente está percebendo que o poder da mídia está na produção e na reprodução de saberes, assim como na representação. Muitos grupos minoritários estão requerendo espaços em diversos produtos midiáticos para mostrar que existem, para se representarem. A mídia, portanto, é um espaço da visibilidade da existência. Diversos grupos sociais querem ser vistos.

             Vale ressaltar que parte da conscientização da transformação cultural que a convergência das mídias tem revelado, na qual os consumidores são incentivados a procurar novas informações em mídia dispersas, é resultado da popularização de pesquisas científicas provenientes da Comunicação Social. Sim, essa é uma ciência que possibilita pensar o quanto um produto midiático impacta e produz uma sociedade. Ela se desdobra em diversas áreas do conhecimento como Jornalismo; Relações Públicas; Publicidade e Propaganda; Rádio, Televisão e Cinema; Cinema; Comunicação e Multimeios. Você conhece este?

              Segundo o site Catho Educação, Comunicação e Multimeios está disponível em apenas duas instituições no Brasil: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC São Paulo) e Universidade Estadual de Maringá (UEM). O Centro Universitário de Maringá (Unicesumar), uma das instituições particulares do município de Maringá, ainda não aparece no site, porque terá sua primeira turma em 2020, de acordo com a página virtual da instituição.

              A fim de investigar como o curso de Comunicação e Multimeios da UEM – o qual está completando oito anos de implementação – está pensando, lidando e formando profissionais para atuar no contexto hipermidiático descrito anteriormente, procuramos a coordenadora e também docente do curso professora Dr.ª Valéria Soares de Assis. “O curso de Comunicação e Multimeios foi se constituindo a partir de uma concepção de comunicação multidimensional que busca atender às demandas contemporâneas que requerem percepção ampla das práticas comunicativas. O curso não concorre com habilitações específicas e sim prepara para atuações na convergência de meios e linguagens”, destaca a coordenadora.

                Valéria ajudou a gestar o curso. Fez parte da comissão que elaborou o projeto pedagógico do curso em 2007, que foi aprovado e criado em 2010, com abertura de vagas no vestibular para ingresso em 2011. Para quem ainda tem dúvida em relação à atuação desse/a bacharel em formação, a coordenadora esclarece que o/a profissional tanto pode atuar como pesquisador/a em Comunicação quanto como gestor/a de comunicação em instituições governamentais ou não, em escolas e em empresas presenciais ou virtuais. Estão habilitados/as a usar a comunicação de forma integradora e estratégica, oferecendo alternativas em multimeios de divulgação, de promoção, de criação e de interação. Podem “desenvolver processos e produtos comunicacionais ainda pouco explorados – como a divulgação científica, a comunicação cultural, a comunicação organizacional, a pesquisa midiática, a assessoria estratégica, a educação a distância – além de produzir novos saberes comunicacionais”, explica a professora.

             Toda essa competência pretendida para o/a estudante é mediada por esforços que congregam os três âmbitos do ensino superior – o ensino, a pesquisa e a extensão – que se intercambiam mutuamente. O projeto de ensino Ás de Paus: laboratório de Comunicação e Multimeios serve como guarda-chuva, pois integra os projetos de extensão do curso. Um deles é coordenado pela própria professora Valéria, o Observatório de Mídias. A docente explica que o objetivo do projeto é “analisar como a produção, a distribuição e a recepção de variados conteúdos midiáticos afetam e participam das práticas sociais e políticas. Os estudantes são estimulados a se pensar e a pensar criticamente o campo da comunicação, intercruzando diferentes fontes de aprendizado oferecidos durante a sua formação no curso”. Também enfatiza que o Observatório propõe uma educação para as mídias que ultrapassa a sala de aula, visando desconstruir noções de senso comum veiculadas na mídia, além de entender que todo discurso veiculado pela mídia é uma prática social, que nunca é neutra e, sim, possui uma dimensão política.

            Nesse sentido, com o intuito de dar voz a quem está em formação, entrevistamos a acadêmica do terceiro ano Débora Primo. Quando questionada sobre o quanto o curso colabora para a formação de profissionais éticos e engajados/as politicamente, a discente defende que a graduação em questão se diferencia pela grade curricular, pois possibilita leituras que formam pessoas “inquietas e que fazem a gente pensar para fora do que seria este hegemônico, para fora do comercial, para fora do vendável”. A acadêmica enfatiza que até mesmo estudantes que, a princípio, parecem indiferentes a reflexões que se contrapõem ao que a grande mídia produz e faz circular são instigados em sala de aula a pensar diferente do senso comum. “O curso tem uma proposta de criar realmente comunicólogos que são pessoas que realmente estudam a comunicação e acredito eu que qualquer um que estude qualquer coisa seja a fundo, com o mínimo de zelo possível, acaba puxando para o seu dia a dia as pesquisas e isso torna a gente bastante inquieto”, conta a estudante.

             Outra iniciativa que colabora para essa formação reflexiva não somente em relação ao que aparece na mídia, mas em relação à criação de meios comunicacionais ecológicos é o SexCom. Coordenado pela professora Dr.ª Ana Cristina Teodoro da Silva, o projeto tem como objetivo “discutir sexualidade, de forma ampla, relacionando-a às pulsões de vida, ou seja, ao Eros que nos encaminha também para a criação, para as artes. Fazemos isso por multimeios, utilizando filmes, vídeos, artes, textos verbais, escritos de autores clássicos (Beauvoir, Butler, Foucault, por exemplo ) e nossas próprias leituras”, explica Silva. Nas palavras da professora, esse tratamento permite que o curso propicie “um ambiente mais acolhedor e plural, de diversas cores e formas, com interessados aprimorando-se e, com isso, expandindo o aprendizado e contribuindo para termos um ambiente democrático”.

            Outra iniciativa do curso é o ComunicaUem, projeto de extensão que complementa os dois mencionados anteriormente, pois atua como um laboratório experimental no qual os/as acadêmicos/as aplicam as reflexões realizadas em outros âmbitos. Nasceu em 2016 para atender a uma demanda identificada pelos professores Tiago Lenartovicz, Gustavo Ferreira, Fernanda Accorsi e Paulo Negri Filho: estabelecer uma identidade para o curso. Ou seja, o objetivo foi identificar o perfil profissional do curso tanto para os/as professores/as quanto para os/as estudantes que, adicionalmente, poderiam visualizar as possibilidades de área de atuação dentro do mercado. Inicialmente, era “conseguir pôr em prática o que a gente trabalhava teoricamente e também na prática no curso de Comunicação e Multimeios, mas fazer isso para poder se tornar visível no mercado de trabalho a partir de um projeto de extensão que é o ComunicaUem”, defende Negri Filho.

            Como resultado, desenvolveu-se uma multiplataforma composta pelos seguintes veículos digitais: site – http://www.dfe.uem.br/comunicauem/ –, Instagram – https://www.instagram.com/comunicauem/ – e Facebook – https://www.facebook.com/comunicauem. Esses veículos propiciam o trabalho multimeios, ou seja, o projeto extrapola a atividade com o texto verbal, propiciando a interação com fotografia, com criação visual, com ilustração, com podcast, com gravação de áudio e com gravação de audiovisual. “A gente tenta fazer um intercâmbio aí do que a gente chama de crossmedia, de vários produtos ou produtos de variadas mídias dentro de uma mesma proposta, dentro do ComunicaUem” completa Negri Filho.

             Atualmente, o professor Negri Filho segue no projeto em carreira solo devido a perdas de TIDE dos professores, bem como ao desligamento da professora Fernanda Accorsi em virtude de sua aprovação em concurso público. Ele nos conta, com entusiasmo, a proposta. Apesar de o projeto ter sido revitalizado com base em uma proposta aplicada por uma professora atuante na disciplina de redação jornalística, a atualização não pressupõe linguagem jornalística, publicitária ou de assessoria de imprensa. O que se pretendia era que “fosse experimental para a gente poder entender na prática o que que era o nosso métier na comunicação e multimeios”, explica o coordenador. Por isso, além do desenvolvimento de uma linguagem própria, a equipe de oito acadêmicos/as reveza funções a cada semana: quem escreve um post no blogue em uma semana, na seguinte, escreve um post para o Facebook, depois para o Instagram ou mesmo produz outro produto como em áudio, vídeo, ilustração ou ensaio fotográfico. “E isso para a gente é multimeios. Conseguir enxergar essas possibilidades dentro das produções, dentro da reflexão que a gente faz em torno da comunicação e das pautas que a gente traz para o Comunica”, completa Paulo.

            Essas definições são feitas em reuniões que ocorrem às terças e às sextas-feiras, sempre no período matutino. Às terças-feiras, são feitas as reuniões de pauta e a análise do que foi produzido. Às sextas-feiras, discutem-se questões técnicas como o uso de softwares de edição de vídeo e de áudio, para solucionar questões pontuais de produção. Sobre as reuniões de pauta, o docente explica que os temas abordados são “de educação, de comunicação obviamente, e daí, nesses intercâmbios dessas áreas, a gente consegue ver várias pautas que também unem comunicação com educação, ou arte com comunicação, ou cultura com educação e a gente vai tentando entender esses links para trazer dentro do Comunica. Ele tem um viés também bastante feminista”, comenta Paulo explicando que se trata de uma herança da professora Fernanda. Nesse mesmo sentido, Débora ressalta a importância que a abordagem de tais temáticas tem, pois não são costumeiramente abordadas em outros lugares. “Ter o cuidado de como abordar essas coisas e ter todo o respaldo científico por trás disso faz com que a gente não saia por aí fazendo as coisas sem pensar, sempre vai por esse viés do outro, de olhar o outro e acho que isso é fundamental também”, pondera a acadêmica.

            Quando questionados sobre o impacto que os esforços de ensino, de pesquisa, e de extensão tem na formação de profissionais em Comunicação e Multimeios, coordenação e corpos docente e discente estão em consonância ao ressaltar três consequências proporcionadas pelo projeto. Primeiramente, formação reflexiva e integral, proporcionada tanto pelo ComunicaUem quanto por outros projetos, os quais possibilitam “a visualização e a experimentação do diálogo que existe nas várias áreas da comunicação, nos vários produtos e nos vários diálogos possíveis dentro da nossa área”, enfatiza Paulo. Em segundo lugar, os resultados do curso são mensuráveis: Valéria aponta que “o curso é um dos com menores índices de evasão, com melhores médias de número de formandos, com grande número de alunos participando de projetos (ensino, extensão e pesquisa) e eventos e com boa absorção de egressos no mercado de trabalho”. Débora ressalta que, na avaliação realizada pelo Estadão, o curso da UEM recebeu quatro estrelas. Por fim, o curso trabalha na lógica da colaboração, pois a lógica da competição é fragilizadora. Nesse contexto, docentes e discentes buscam o diálogo e a cooperação para superar as adversidades “Procuramos tratar a diferença não como ameaça, mas como riqueza. Não escanteamos as tensões, mas as tornamos aliadas para a colaboração. As formas de colaboração vêm nos aglutinando nas mais diferentes atividades”, pondera a professora Valéria Assis, coordenadora do curso.

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