imagem: claudia.abril.com.br

 

por Micheli Ribas

 

              O novo filme do cineasta espanhol Pedro Almodóvar, Mães Paralelas, disponível na Netflix, apresenta uma trama que mescla o drama íntimo de duas mães solteiras à memória de um passado ditatorial, o Franquismo (1939-1976), que deixou marcas indeléveis. Assim, revisita o passado, sem deixar de olhar par a o futuro.

        Desta vez o cineasta escolhe falar das dores da maternidade, ao reunir duas mães, em momentos de vida bem contrastantes – uma de quarenta anos, Janis (Penélope Cruz), fotógrafa, com sólida carreira profissional, e uma adolescente, Ana (Milena Smit), que mal consegue ter apoio dos pais. Ambas engravidaram sem planejar, mas a primeira está muito feliz, enquanto a segunda, traumatizada por ter sido vítima de estupro, tem, obviamente, várias inseguranças. A trama se desenrola com uma aproximação entre essas mulheres, de forma inesperada, desde o dia em que dão à luz. A partir daí, a película de Almodóvar são só segredos e sofrimentos para as protagonistas.  E nas entrelinhas da maternidade, aparece a história política do bisavô de Janis, levado pelos falangistas, vítima do fascismo espanhol do general Franco.

         O filme, com linguagem melodramática, é quase todo baseado em personagens femininas, com exceção do antropólogo Arturo (Israel Elejalde), pai da bebê de Janis. Ele, antropólogo forense, é funcionário da Irmandade para a recuperação da memória histórica e é chamado para reunir uma equipe de especialistas em escavações arqueológicas para encontrar a fossa onde está enterrado o bisavô de Janis – que era professor e fotógrafo-, fossa que ele próprio teve de cavar. Momento forte da narrativa em que objetos das vítimas vão sendo encontrados durante as escavações, como um chocalho, um olho de vidro, um corpo amarrado em arame farpado.

          Pedro Almodóvar, que não pôde estudar cinema na juventude por falta de recursos na família, no entanto, é um dos artistas mais premiados da indústria cinematográfica. Dono de dois Oscar, por Tudo sobre a minha mãe (1999) e Fale com ela (2002), dois Globos de Ouro, quatro prêmios no Festival de Cannes e no BAFTA, além de seis vezes vencedor do maior festival espanhol, o Goya.

             Almodóvar tem um estilo único de contar histórias fortes, sensíveis, intimistas. Suas tramas trazem o feminino para o centro e valorizam cores quentes na direção de arte e na fotografia. Pode parecer que ele reutiliza as mesmas fórmulas em seus longas, o que não deixa, em parte, de ser verdade. No entanto, mais uma vez, percebe-se que o diretor, como artista talentoso que é, ainda tem muito a dizer. Algo que fica claro quando ele destaca a citação das palavras de Eduardo Galeano: “Não existe história muda. Por mais que a queimem, por mais que mintam, história humana se recusa a ficar calada.”.

          A ótima interpretação de Penélope Cruz no longa lhe rendeu a indicação ao Oscar 2022, assim como a bela trilha sonora de Alberto Iglesias. Um filme recomendado para pessoas sensíveis, que curtem o jeito único de Almodóvar de abordar as contradições humanas.

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