por Isabela Cristo e Thamires França

 

            Com o passar dos anos, o vegetarianismo e o veganismo têm se tornado comum entre jovens e adultos na sociedade. Ambas as práticas consistem na ausência de carne na alimentação, porém no veganismo, considerada mais “radical”, acontece a retirada de todo e qualquer produto/alimento de origem animal como ovos, leite, lã e todos os alimentos que possuem derivados em sua receita. Harish Sethu, professor de engenharia da Universidade Drexel (EUA) fez o cálculo sobre os efeitos da eliminação da carne do cardápio e a estimativa mostrou que quem não come carne evita a morte de até 582 animais por ano.

            A grande dúvida que permeia sobre essas práticas gira em torno da capacidade dos vegetarianos e dos veganos em se manterem saudáveis, pois para a sociedade, em geral, é quase impossível sobreviver sem algum tipo de carne (vermelha ou branca) na alimentação e, ao mesmo tempo, estar com as vitaminas e proteínas em dia. “É possível garantir uma alimentação com qualidade de vitaminas e proteínas sem o consumo de carne. As proteínas e vitaminas presentes na carne podem ser encontradas em outros alimentos como: leite, queijo e ovos que são ricos em proteínas e em vitamina B12, que é encontrada quase exclusivamente em alimentos de origem animal; além de alimentos de origem vegetal como legumes e verduras, feijões, grão de bico, lentilha, nozes, amêndoas, castanha de caju, entre outros”, afirma a nutricionista Alessandra Sbizero.

           Alessandra também pontua que, apesar da alimentação de veganos e vegetarianos ser considerada saudável, é preciso ficar alerta em relação à reposição de nutrientes. “Alguns estudos já realizados com indivíduos que se encaixam nesses grupos, perceberam que uma alimentação vegetariana ou vegana pode reduzir o risco de hipertensão, colesterol alto (quando comparados com aqueles que incluem a carne nas refeições), mortes por infarto, câncer de próstata, pedras na vesícula, diabetes, entre outros. No entanto, os indivíduos que são veganos ou vegetarianos devem ficar atentos: exames de sangue devem ser feitos frequentemente para analisar se todos os nutrientes necessários para nosso organismo funcionar normalmente está sendo fornecido através da alimentação”.

            A Profa. Dra. Evely Vânia Libanori (DTL-UEM), a qual possui pós-doutorado em Crítica Social com ênfase em estudos animais, comenta que sua alimentação se tornou assunto sério após ter se tornado vegana, há quatorze anos, e que sua saúde também mudou. “No começo, quando eu não sabia me alimentar, eu seguia uma dica simples dos nutricionistas: a comida no prato deve ser colorida. Com o tempo, eu li e aprendi muita coisa. Eu sei como viver bem comendo do jeito certo e os alimentos certos […] Quando eu vou ficar muitas horas fora de casa, levo meu lanche. Quase nunca acho lanches veganos para comprar”. Para ela, porém, a maior dificuldade que enfrenta pela sua opção não é a questão da alimentação, mas é ser compreendida pelas pessoas. “Sou muito questionada em relação à razão de não comer carne: “É por que você não gosta?”, “É por dieta?” “É por causa de religião?”. Quando explico que é porque não quero fazer mal ao animal, a reação é sempre de surpresa. E algumas vezes, vem piadinha junto. O pensamento de que devemos ser éticos para com os animais é novo na nossa cultura. Algumas pessoas sequer jamais pensaram nos animais como indivíduos sencientes, ou seja, que possuem a capacidade de sentir sensações e sentimentos de forma consciente. Por isso me estranham”, afirma.

          O vegetarianismo e o veganismo são formas de vida adotadas por diversas razões, sendo a principal delas o respeito à vida dos animais e a não-violência contra eles. Há uma grande variação de dietas vegetarianas em relação ao que é consumido. O vegetarianismo ovolactovegetarianismo exclui todos os tipos de carnes, mas inclui ovos, leite e laticínios; o lactovegetarianismo exclui todos os tipos de carne e também o ovo, mas são consumidos leite e seus derivados; no vegetarianismo estrito são excluídos todos os produtos de origem animal, como ovos, laticínios e mel. Apesar de o vegetarianismo estrito ser frequentemente confundido com o veganismo, há uma diferença: no veganismo, além de não ser consumido nenhum alimento de origem animal, também não se é utilizado nenhum produto não-alimentício proveniente de animais, nem os que são testados em animais. O veganismo é um movimento que difunde o respeito aos direitos animais.

           Em relação aos motivos de se tornar vegana, Evely comenta que foi um processo gradativo. Tudo começou quando tinha apenas 15 anos e visitou um frigorífico, ficou horrorizada com o que viu e decidiu parar de comer carne de boi, porém continuou pensando que o consumo de frango e porco fosse comum. “Em 2005, assisti na Internet documentários sobre o processo de criação e de morte dos animais. E vi toda a crueldade envolvida. Entendi que não havia outra saída a não ser o veganismo. Naquele ano parei de me alimentar de tudo que viesse do corpo dos animais e, também, deixei de usar produtos neles testados. Tomei a decisão de me tornar vegana para ter paz na consciência. Hoje, não é mais possível dizer que não sabemos que os animais sofrem. E não é ético explorar os seres mais frágeis e vulneráveis, aqueles que não podem se defender da nossa capacidade de fazer mal a eles. Explorar e usar quem não têm condições de se proteger de nós é praticar a cruel lei do mais forte”, explana.

            Existe uma aproximação muito afetiva entre vegetarianos/veganos e os animais, pois esse grupo passa a vê-los não como alimento, mas sim como um ser que merece viver seu ciclo completo, sem precisar ser morto e acabar no estômago dos seres humanos. Assim, é comum pensar que todos os animais, sem exceção, também sentem e possuem consciência. Em 2012, uma equipe de neurocientistas assinou a “Declaração de Cambridge sobre a consciência em animais humanos e não humanos”. A Neurociência já sabia da capacidade de senciência dos animais e, nesse ano, ficou provado que eles também possuem consciência. Eles conhecem sua identidade, seu papel no grupo social e interagem de forma inteligente com o ambiente. Animais são seres sensíveis e conscientes como os seres humanos. Ignorar essa evidência é ser especista, ou seja, considerar apenas os seres da espécie humana como dignos de tratamento ético.

            O veganismo, como uma forma de viver, modifica a vida de quem o pratica. “Ser vegana mudou a mim e meu mundo. Parei de consumir animais para ficar bem com a minha consciência. Até 2005, eu sentia um profundo pesar quando via um caminhão transportando animais para o matadouro. Mas como eu poderia ter compaixão e me servir da carne deles? Eu não tolero a violência contra humanos, não poderia tolerar a violência contra os animais”, declara Evely. Além disso, sua vida profissional também tomou rumos diferentes devido ao veganismo, pois “a defesa dos animais passou a ser a atividade mais importante da minha vida. Porque eles não podem se defender sozinhos, precisam de humanos que sejam a voz deles. Então, há uns doze anos, eu passei também a estudar os animais na Literatura por meio do referencial teórico da ética e da poética animal.

            “Estou contente com o rumo que minha carreira tomou. A Literatura tem me permitido fazer um trabalho de enorme relevância: pensar a ética com a qual nos relacionamos com os animais. E não sei de nada mais urgente do que libertar da dor o ser que sofre”, afirma Evely. A Literatura tem dado voz não somente ao trabalho da professora Evely Libanori, mas também de John Coetzee, Regina Rheda, Ana Paula Maia e outros autores, os quais escreveram obras na intenção de promover a libertação dos animais dos usos humanos. Além de escritores da área de Literatura, o assunto também instiga profissionais de outras áreas, como Maurício Kanno, jornalista e mestre em comunicação, o qual tem se dedicado a reunir as composições literárias marcadas pelo tema da ética animal e lançou um livro de poemas e um livro de crônicas de diversos autores contemporâneos.

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