por Giovanna Ursulino e José Aurélio Andrade

 

       Vivemos em um mundo, onde cada vez mais se é possível e cada vez com mais facilidade entrar em contato com outra cultura, diferentes pessoas, diferentes realidades e pensamentos, sejam eles políticos, religiosos, econômicos sejam sociais, podem vir a adentrar nosso meio social, seja como um colega de trabalho, um vizinho, professor, chefe, funcionário, ou um simples convívio em meio às redes sociais, e talvez seja aí que um de nossos maiores atuais problemas esteja. Será que estamos sendo capazes de ouvir, ou simplesmente de respeitar a opinião de outra pessoa? Será que somos capazes de pautar nossas opiniões sem que façamos o uso de termos pejorativos ou palavrões alheios? Esse texto vem com a intenção não de criar um debate sobre o que está certo e o que está errado, mas de mostrar que precisamos hoje, mais do que nunca, aprender minimamente a respeitar opiniões que sejam divergentes da nossa.

          Talvez no âmbito político, podemos ver como o quão agressivas são as ações daqueles que veem pessoas pensando de maneiras diferentes. Codinomes pejorativos são trocados entre ambos os lados: “coxinha” e “petralha” são exemplos disso. Ainda há aqueles que não pertencem unicamente a algum desses grupos, mas que quando apresentam pequenas ideias ou apontem algum ponto negativo ou positivo de determinado grupo são colocados como inimigos que devem ser  ridicularizados e excluídos. Esse confronto, que muitas vezes é mascarado mesmo estando muito presente, principalmente em nossas redes sociais, em nosso próprio dia a dia, acaba oprimindo algo em que deveríamos exercitar cada vez mais em nossa sociedade atual, dialogar. Um exemplo antigo mas que ainda deve ser citado, é o muro de Berlim que separava uma Alemanha Socialista de uma Alemanha Capitalista,  consequentemente, milhares de famílias. Um fato antigo, mas que não ficaria tão longe de nossa realidade se lembrarmos que, há pouco mais de uma ano, no dia 12 de abril de 2016, foi erguido um muro em frente a Esplanada dos Ministérios, em Brasília, que, para alguns blogs considerou-se o símbolo de um país dividido.

         O Brasil viveu dias de tensão devido a todo esse atrito entre pensamentos opostos na política que vêm separando o país, mas divisões assim não estão restritas apenas a nossa realidade. O atual Presidente dos Estados Unidos, Donald J. Trump, continua com seu tão criticado projeto de construção de um muro que separa ainda mais o México de seu país. Como se não bastassem fronteiras físicas ainda existe a criação de leis que restringem a entrada de mulçumanos no país, e Trump não é o único com atitudes como esta. O politico holandês Geert Wilders promoveu sua campanha, uma espécie de cruzada anti-islâmica e anti-imigração, em cima de um assunto que deixou ainda mais visível a polarização do pensamento holandês em relação à imigração. Ele tem como algumas de suas propostas o fechamento das mesquitas e a proibição do uso do véu em locais públicos. Só para que possamos entender tais atos, segundo Wilders, o islã não é uma religião, mas sim um ideal antiocidental.

           Daniel Schiavini, brasileiro naturalizado holandês, que vive no país há nove anos e trabalha como programador numa multinacional de softwares, vê com preocupação o impacto do discurso de ódio aos imigrantes. Para ele “as pessoas estão bravas com a situação e Wilders conseguiu colocar a culpa de tudo nos imigrantes, o que acaba criando um clima maior de intolerância”.

         Como se já não bastasse questões políticas e religiosas, ainda temos essas questões nos âmbitos racial e de gênero. E, embora as lutas diárias pelo fim da discriminação e pelo empoderamento das minorias, o problema continua a espreitar a sociedade e oprimir as pessoas. Em nossa universidade existem muitas vozes prontas para discutir e desmistificar a questão do preconceito e a maneira como a mídia aborda o assunto, como é o caso de Daniel Camargo, tradutor graduado pela Universidade Estadual de Maringá. Ele, que veio de uma família de classe média-baixa negra e é neto de ribeirinhos, conversou conosco e nos esclareceu alguns pontos a respeito do preconceito racial e explicou que “o preconceito começa e é fruto de institucionalização, e isso acarreta na naturalização do mesmo. Por exemplo, é uma maneira de demonstrar preconceito quando a gente faz piadinhas em relação ao cabelo, ou em relação em como uma determinada pessoa se veste. E eu acredito que tudo isso seja fruto de uma manifestação da sociedade, refletindo nas pessoas e em seus atos.” No caso do racismo, ele explica que “o preconceito construído em cima da aparência do negro é algo histórico, determinado pelo fator da supremacia racial, que sempre existiu e foi institucionalizado, desconsiderando e reduzindo a pessoa negra e tudo o que é subjetiva a ela.”. Camargo aponta ainda que o problema do preconceito se deve ao fato de vir mascarado sob o conceito de opinião, “Observa-se que em manifestações de fobia e preconceito, o julgamento em relação à determinada pessoa – seja ela negro, mulher, gay – reflete sobre as diversas opressões racistas, homofóbicas e machistas, e estas acabam sendo silenciadas quando são percebidas. O silenciamento causado por opressões simbólicas e naturalizadas, muitas vezes são tidas como um conceito de ‘opinião’”.

           Não é novidade que durante muitos anos negros, índios, homossexuais e outros grupos foram excluídos, escravizados, mortos ou, no mínimo, ridicularizados. No Brasil, apesar de toda a miscigenação e intercâmbio cultural vivido, ainda não fomos capazes de vencer o modo arcaico e lamentável de julgar e tratar as minorias. No entanto, existem grupos determinados a discutir sobre o tema e lutar pelos seus direitos, fomentando a resistência diária, como nos conta Camargo: “Eu acredito que a melhor forma de entender determinada opressão é procurar por pessoas, coletivos onde a pessoa se vê. Eu faço parte do Coletivo Yalode-Bada e por seu intermédio conheci pessoas que também debatem e desabafam sobre racismo, LGBTfobia e machismo. Esses debatem nos ensinam como lidar com o preconceito e como entender que, eu enquanto homem sou passivo a manifestações machistas, e por isso eu devo ter consciência de onde vem isso e como eu posso agir de uma maneira eu evite que eu tenha esse tipo de discurso.”

           Daniel Camargo nos explica sobre o que é o local de fala e a importância de se dar voz às pessoas. “Local de fala é um termo que aparece com frequência em conversas entre militantes de movimentos feministas, negros ou LGBT. Diz respeito às vozes de quem sofre um determinado tipo de preconceito por ser quem é, por exemplo: eu não posso falar sobre o que uma mulher sofre em relação ao machismo, mas eu posso discutir enquanto homem como nós, homens, podemos driblar o machismo ou até mesmo acabar com ele. Eu acredito muito em local de fala, e você saber quando você pode e deve falar é um passo muito importante. E daí a necessidade dessas vozes serem ouvidas e de fazermos parte dessa luta diária junto a elas”.

           Por fim, quando questionado sobre a melhor maneira de mudarmos esses pensamentos e atitudes preconceituosas, Daniel diz: “As pessoas não nascem preconceituosas. E eu acredito, assim como Beyoncé, Lázaro Ramos, Laís Fialho dizem, que o nosso trabalho de conscientização começa através da educação e em como educamos nossas crianças.”

            Como prova disso destacamos uma pesquisa feita recentemente pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE), intitulada “Preconceito e Discriminação no Ambiente Escolar”, que mostrou que dentro do âmbito escolar o preconceito está enraizado em 99,3% das pessoas entrevistadas. Os números revelam que 96,5% dos entrevistados tem preconceito com portadores de necessidades especiais, 94,2% têm preconceito contra grupos étnicos- raciais, 93,5% de gênero, 91% dos entrevistados revelaram ter discriminação etária, 87,3% com relação à orientação sexual e 75,95% tem preconceito territorial. A pesquisa foi realizada a pedido do Instituto de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) e contou com mais de 18,5 mil alunos, pais e o quadro de funcionários. O professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP), José Afonso Mazzon, disse para o site Observatório Brasil para Igualdade de Gênero que “o fato de todo indivíduo ser preconceituoso é generalizado e preocupante.” O resultado da pesquisa será analisado pelo MEC, uma vez que é já existem iniciativas que buscam melhorar essa abordagem de respeito à diversidade.

           Embora nossa sociedade tenha evoluído em diversos aspectos, alguns pontos precisam ser revistos. Para Alexandre Lini, estudante da Universidade Estadual de Maringá (UEM), fica evidente que em meio a tanto preconceito, muitas vezes o respeito é capaz de sobreviver, “Eu nunca precisei fazer nenhuma pergunta sobre minha sexualidade. Não me deram uma escolha em certa parte da vida sobre ser hétero ou homossexual. Sempre enxerguei como uma característica. Minha mãe sempre se preocupou com minha educação, saúde e comprometimento com a vida. Nunca sofri preconceito nenhum dentro da minha casa, e acho que sou muito abençoado por isso.”

             Quando questionado se ele já havia sido discriminado a respeito da possibilidade dos preconceitos desaparecem com o passar do tempo, ele diz: “Acredito que sempre sofremos preconceito, não? Veja só, ‘pré-conceito’ algo que sempre julgamos antes de entender, compreender, aceitar ou respeitar. Os preconceitos sempre estarão presentes na sociedade, mas claro que há meios de inclusão que podem amenizá-los, para que pessoas como nós não se excluam e se prendam dentro de si. Acredito que os motivos que levam as pessoas a serem preconceituosas são o medo, a vulnerabilidade, a inveja, uma autoestima tão elevada que tudo o que não diz respeito à forma como elas foram criadas e os exemplos que elas recebem pela vida, fazem com que ela aja assim”.

          Mas apesar de tantos exemplos “ruins” de como a falta de compreensão, respeito, conhecimento, afetam de maneira violenta ou criam uma barreira entre pessoas, o que limita nossa capacidade humana de ser social ou a transforma em um egoísmo destrutivo, seja em uma escala mais próxima e pequena, como uma sala de aula, empresa, como em uma nação inteira. Temos que superar essa primeira impressão, esse preconceito, essa pré-impressão, através do respeito e conhecimento enriquecendo assim nossas relações sociais em todos os aspectos.

           Existem pelo mundo várias ONGs ou até mesmo empresas que possibilitam ao jovem essa compreensão ou ainda mais entender em nível mundial toda a pluralização que é o mundo em que vivemos. Marcos da Silva, estudante de Direito e Diretor de gestão de Pessoas da AIESEC, teve a oportunidade de realizar um intercâmbio no México. Durante a experiência pôde notar singularidades entre a cultura dos brasileiros e a dos mexicanos, e isso possivelmente mostraria a ele uma certa divergência de opiniões. “Considero-me uma pessoa muito mais tolerante quanto a diferenças de opinião, porque entendo que cada um de nós nasce e cresce em um ambiente único, vejo inclusive certa beleza nisso. Somos todos diferentes, essa é uma realidade que vivi intensamente no meu intercâmbio, e isso não vai me impedir de criar empatia pelas pessoas ao meu redor, apesar de suas diferenças”, declarou.

          A partir de diversos entendimentos como o que foi citado acima e uma educação praticada logo na infância como afirma Alexandre Lini, “A escola sempre foi um grande incentivo,  paras as coisas boas e/ou ruins. Acho que ela é a base de tudo. E também os exemplos dentro de casa. Se você é educado(a) para tratar a todos com respeito, você irá permanecer assim”. Podemos construir uma sociedade que se entenda como sociedade, não apenas conhecendo, mas respeitando aqueles que possuem suas diferenças, sejam elas físicas, psicológicas, sociais, geográficas, religiosas ou políticas.

 

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