por Íngrid Lívero

           Na noite de ontem, 6, a Festa Literária Internacional de Maringá teve sua 6ª edição, intitulada “Conexões”, inaugurada com a palestra de Zeca Camargo, a respeito de seu livro “O Planeta Elza”. O jornalista discorreu sobre o trabalho de escrita da biografia de Elza Soares, cantora e compositora amplamente aclamada no Brasil e no mundo. As falas iniciais pertenceram às autoridades presentes, aí inclusos o prefeito da cidade de Maringá, Ulisses Maia, o diretor de cultura, Francisco Pinheiro, e o curador da FLIM 2019, Rogério Pereira, os quais comentaram a respeito da organização dedicada à Festa e novos recursos que serão destinados ao âmbito cultural de Maringá a partir de 2020.

            Em seguida, foi apresentado o convidado da noite, Zeca Camargo, para seu bate-papo sobre “O Planeta Elza”, mediado por Victor Simião. Após agradecimentos gerais e breves comentários sobre seu envolvimento com a música desde muito cedo, Camargo compartilhou um pouco da experiência de escrever a biografia de um ícone da música brasileira, e como a preocupação com a recepção permeou Elza nas várias entrevistas concedidas a propósito de se recolher material para o livro. Ele conta que a cantora compartilhou mais de 80 anos de história, e, como jornalista, ele precisou se preparar para transcrever seus encontros com ela de forma a dar um formato, a percorrer um processo de construção que ia para muito além de uma simples cópia: “a entrevista para biografia deve ser montada em algo maior, deve-se criar um contexto, quase em um trabalho arqueológico, para que se possa trazer o leitor para o pensamento de Elza”.

            No entremeio desse processo de construção, o jornalista e escritor comentou como certos momentos tristes eram vistos por Elza Soares como momentos “fracos”, os quais ela não gostaria que os outros vissem e lessem sobre. Assim, de maneira a de não deixar muitos pontos sensíveis de fora, Camargo explicou seu trabalho de pedir permissão para que escrevesse e, posteriormente, de ler para Elza o que havia sido contado, ao passo que, ao final, boa parte desses momentos acabassem integrantes do livro. Resumidamente, alguns pontos principais da vida da cantora foram explanados e detalhes, bem como impressões pessoais, foram adicionados à fala. Camargo relatou que ela vem de uma família de essência bastante forte, logo tem um aspecto maternal marcante, além das várias tristezas que perpassaram sua vida (ser obrigada a casar aos 13 anos, perder 2 filhos em um curto período de tempo), as quais ele considera que a construíram como ela é atualmente: “tudo que ela representa hoje – empoderamento feminino, sobrevivência negra, dentre outras coisas – foi aprendido por experiência pessoal, muito mais do que ler, ela sentiu e viveu tudo aquilo que a define”.

             Com foco na área musical, também persistem dificuldades por toda a carreira de Elza, desde as proibições ao canto quando começou a mostrar seu talento (o que fazia escondida) até a tentativa de enquadramento em um só gênero. “Sou muito mais do que isso”. Camargo contou como ela se expressava ao tentarem definir qual era o seu estilo musical, e acrescentou uma opinião compartilhada entre ele e a cantora: “os problemas que as mulheres negras eventualmente enfrentam hoje são os mesmos de antes, infelizmente, a humanidade não mudou”. Notavelmente, conforme o jornalista, Elza Soares é uma mulher bastante coerente, de maneira que sempre foi “a mesma Elza” lutando por sua sobrevivência e, tanto em suas composições iniciais como em “Planeta fome” – uma das produções mais recentes -, se guia pelos mesmos princípios.

             Direcionando o olhar para o fazer jornalístico, as perguntas dirigidas ao convidado exploraram o trabalho da entrevista e da escrita na forma biográfica. Zeca Camargo definiu entrevista como “um trabalho formal, uma missão, e você tem que ser profissional para tomar sua posição”, também comentando que a discussão, o raciocínio, deve-se guiar de forma que seja uma conversa da qual se saia melhor, com impulso para evoluir suas opiniões após ter ouvido a opinião exterior, e acrescentou que “as pessoas não discutem mais, ninguém aceita ideias que não as suas”, quando a cultura, na verdade, se adquire, é preciso descobrir mais, e isso só é possível quando se investiga e se discorda: “por favor, discordem de mim” ele comenta. Finalizando, ele compartilhou seu olhar sobre as histórias e a escrita, dizendo que escrever deve ser algo feito de maneira honesta e transparente, pois “não é enfeite, mas sim tornar aquilo verossímil”, o que deve ser feito uma vez que tudo é história. “Nós só somos humanos porque vivemos de narrativas, o segredo é que você se identifique”. O bate-papo foi finalizado com uma sessão de autógrafos e fotos.

            A 6ª FLIM conta com atividades até domingo próximo, incluindo apresentações culturais, uma vasta feira de livros de várias editoras e convidados que, de algum modo, contribuem à parcela cultural da região e literária de forma geral. A programação se encontra completa no site oficial da FLIM e O Consoante continua com a cobertura do evento.

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